E acreditar que o fizemos ...

E acreditar que o fizemos ...

Olhando para trás, é duro acreditar que estejamos vivos até hoje. Nós viajávamos em carros sem cinto de segurança ou air bag. Gastamos horas construindo nossos carrinhos de rolimã para descer ladeira abaixo e, só então, descobríamos que tínhamos esquecido dos freios. Saíamos de casa pela manhã e brincávamos o dia inteiro, só voltando quando eram acesas as luzes da rua, com uma chave coletiva que iluminava o bairro todo de uma só vez. Brigávamos, e chegamos a nos esmurrar, mas aprendemos a superar o fato. Não tivemos vídeo-games, Internet, TV a cabo, só mesmo o velho e saudoso chiar de um noveleiro. Tivemos, sim, amigos. Enroscávamos nossas pandorgas na fiação elétrica, jogamos futebol em quase todos os campinhos, nadamos em quase todos os arroios, pescamos até na cascata do Tega. Roubamos as pêras dos Kramer, as uvas do Biondo, os salames do armazém da esquina, sendo estes içados por um gancho. Na escola, alguns estudantes não eram tão inteligentes quanto os outros. Eles repetiam o ano! Se quiséssemos ir a um baile, o fazíamos a pé, em grandes turmas, e depois, lá pelas 2h ou 3h, retornávamos da mesma forma. E dizer que vivemos em uma época em que os dias realmente duravam 24 horas, e que elas eram suficientes para que pudéssemos fazer tudo aquilo que nos dava prazer, que nos dava conhecimento e alegria; e dizer que a maioria de nós começou a trabalhar em torno do 14 anos, e quando não antes disso, e nenhum perdeu a dignidade ou algum pedaço do corpo devido ao fato. Vivemos a liberdade, o fracasso, a imposição paterna, o sucesso e a responsabilidade, e aprendemos a lidar com isso. Luiz Henrique da Rocha

ORIGINAL DE FEVEREIRO DE 2002.

Página 3 - Caxias do Sul, 11 de agosto de 2003 - Edição nº 8630

JORNAL PIONEIRO - COLUNA DE Anahi Fros - 11/08/2003